Antes de falarmos dessa moça, é importante ressaltar que todo
relacionamento começa de um detalhe, um olhar que te prende, uma
gentileza que te conquista, uma beleza que te encanta. Cometemos um
grande erro ao sustentar uma relação baseada nas expectativas que foram
criadas neste primeiro contato, e assim, nos cegarmos ao ponto de
ignorar a verdade que está sempre diante dos nossos olhos.
O alívio e a perda chegaram juntos na vida de Ana. Agora, ela chora a
dor que a paz lhe trouxe. Ele se foi. A casa parece maior, o coração
parece vazio. Ana sabia que uma hora isso aconteceria, aquele homem
precisava partir para que ela tivesse sua vida de volta. Chorando ela
leu o bilhete deixado na porta da geladeira, em seguida foi para o
quarto, o cheiro dele ainda estava no lençol, sua blusa preferida foi
deixada para trás. Do guarda-roupa, Ana retirou uma caixa que continha
todos os nãos que ela guardou. Em soluços, se perdeu em meio as
lembranças.
Como ela poderia se esquecer do primeiro não? Lembra como se tivesse
acabado de acontecer. Um mês de namoro. O motivo foi um atraso bobo, dez
minutos apenas, a culpa sequer foi dela, mas aquele homem nem quis
saber e gritou feito um louco. Ana deveria ter dito: "Não! Não aceito
que fale comigo dessa forma." Mas, o relacionamento era recente, ela
estava apaixonada e ficou com medo de que ele desfizesse tudo ali mesmo,
caso fosse contra a atitude dele, por isso ela apenas se desculpou,
guardou aquele não, o primeiro não, e jurou a si mesma que usaria quando
realmente fosse necessário.
Ele gritou e não a perdeu. Ana aceitou aquilo como um defeito, uma mania
feia que com o tempo poderia ser deixada de lado. Assim, ele continuou
gritando sempre que algo lhe desagradava, porém, seus gritos já não
assustavam Ana. Ele precisava se impor de outra forma. Certa vez, os
dois combinaram de ir à um jantar com um casal de amigos. Ana estava
linda, ele sabia que seria impossível outro homem não admirá-la e se
encheu de ciúmes. Como tirar o brilho de Ana? Como impedi-la de sair tão
bela? A ofensa foi sua arma. Disse que o vestido ficaria melhor se ela
não fosse tão gorda, se o cabelo não fosse tão feio, e a acusou dizendo
que sua intenção era atrair o olhar de outros homens, que ela não
prestava e usou palavras horríveis. Como ele foi capaz de falar e pensar
isso dela? Era a hora de Ana dizer: “Não! Não aceito que me ofendam
dessa maneira.” Mas, ela já o amava tanto. Naquela noite sua beleza foi
roubada pelas duras palavras daquele homem, para não perdê-lo, outro não
foi guardado naquela caixinha.
Ele gritou, ofendeu e não a perdeu. Os momentos agradáveis da relação
serviam para alimentar a esperança de havia um bom homem por trás de
tanta grosseria, afinal ele dizia que tudo o que fazia era por amá-la
demais. Foi por amor que ele a proibiu de sair sozinha. Um dia, Ana
sentiu vontade de caminhar, olhar as vitrines, tomar um sorvete, mas se
esqueceu de avisá-lo. Ele a encontrou na rua, furioso a pegou pelo braço
e a arrastou por três quarteirões, deixando a na porta de casa
novamente. Pensei que Ana usaria o não. Pensei que diria: “Não!Não
aceito que me toque dessa forma.” Mas, quando viu aquele homem em
prantos pedindo que ela o perdoa-se, Ana, que sempre teve um bom
coração, decidiu guardar também esse não. E ainda, prontificou-se a
ajudá-lo a controlar suas emoções.
Ele gritou, ofendeu, maltratou e não a perdeu. Dois anos de namoro e
eles decidiram morar juntos. Ana levou consigo sua caixa de nãos. O não
que deveria ter dito quando ele a proibiu de falar com seus amigos. O
não que deveria ter dito quando ele quebrou todos os presentes que ela
tinha ganhado de outras pessoas. O não que deveria ter dito diante das
ameaças daquele homem. O não que ela deveria ter dito por causa das
feridas emocionais que ele lhe causou. A caixa já estava cheia, mas ela
foi obrigada a colocar um novo não, o não mais sofrido, o não que mais
desejou falar, e que já tinha um destino definido, a caixa, pois dizê-lo
poderia trazer consequências piores. Ana não saía de casa, não tinha
amigos, mas ele sismava que ela o traía. Mesmo suportando tudo isso,
para ele, ela nunca o amou o suficiente. Por ele pensar assim, inúmeras
vezes, Ana se viu esparramada no chão, sentindo as dores da raiva
daquele homem. No corpo carregava as marcas dos socos e chutes que
recebia quase que diariamente. Ana queria dizer: "Não! Não posso aceitar
que me machuque." Mas, já não podia usar o não. Ana, nossa amável e
delicada Ana, porque não disse não, quando alguém foi capaz de gritar
com uma pessoa assim tão doce?
Ele gritou, ofendeu, maltratou, machucou e ... a matou? Não! Dessa vez, a
vida gritou esse não por Ana. Esse homem gritou, ofendeu, maltratou,
machucou e, por sorte, deixou apenas um bilhete na porta geladeira,
dizendo que não a queria mais, que nunca a amou e que por esse motivo
estava indo embora para sempre. Sozinha, Ana sente um peso sendo
retirado do seu ombro, mas sofre pela morte da esperança que tinha de
que ela o mudaria. Ana pensa que ainda ama aquele homem, mas na verdade
ela sempre amou as expectativas criadas no primeiro contato dos dois, e
por essa expectativa continuou lutando mesmo sem força. Hoje, não
importa se ela foi machucada uma vez ou as mil vezes que ele a feriu, o
que ela temia lá no começo aconteceu, foi apenas adiado da forma mais
dolorosa possível. Por insistir, Ana, como vitima, só aperfeiçoou as
atitudes do agressor. Quando o grito parou de fazer efeito, ele lançou
mão das ofensas. Quando Ana já suportava as feridas emocionais,
começaram as agressões físicas, e se o agressor não tivesse parado por
aí, chegaria ao ápice de seu aperfeiçoamento, que era tirar a vida da
nossa Ana.
É verdade que o amor tudo sofre, como também é verdade que o amor nunca,
nunca machuca alguém. Sofre por amor o casal que junto decide suportar a
distância que o separa. Sofre por amor o casal que junto enfrenta uma
doença. Sofre por amor o casal que junto passa por uma crise financeira.
Agora, quando um dos dois decide provocar o sofrimento na relação, é
sinal de que o amor não está presente.
Se enganar por causa de um olhar, de uma gentileza, por causa da beleza
de alguém, acontece. Agora, insistir, guardar os nãos, aceitar ser
maltratado, é uma escolha. Nenhum relacionamento começa com um pontapé,
um murro ou uma facada nas costas. Você nunca ouvirá uma mulher dizer:
“Eu estava sentada admirando a paisagem, ele chegou me deu um soco e não
teve jeito, eu me apaixonei.” É preciso caminhar para esse fim, é
preciso ignorar muita coisa, é preciso esquecer seu valor para chegar a
esse ponto.
A mulher é o sexo frágil sim, e deve ser tratada com a delicadeza que a
natureza feminina exige. Ei, princesas, não abram de suas coroas.
Príncipes, não menosprezem o maior bem que podem conquistar. Não
diminuam a beleza do amor contentando-se com tão pouco. Muitas mulheres
desejaram a sorte Ana, mas infelizmente hoje não estão aqui para
narrarem suas historias. Ana chora porque no fundo sabe que se tivesse
dito não naquela primeira oportunidade, hoje sua caixa estaria vazia.Hoje, é difícil ler um jornal onde não haja um registro de violência contra a mulher. Na maioria dos casos esses crimes são cometidos pelos maridos e companheiros das vítimas. Nosso papel é incentivar a denúncia. Conscientizá-las de que as atitudes da vítima podem aperfeiçoar o agressor. Por uma vida sem violência! Temos nossas palavras, vamos usá-las juntos!
Este e mais textos você encontra em: Encontra-me em minhas palavras...
6 comentários:
Vish sinistro! kkk
flor a paleta custou 230 reais! bjs
Sinistro mesmo, porém realista.
230? O.0
Nem foi cara imagiina, aiin como eu queria uma paleta desta.
beijos :*
Vanessa, muito obrigada por compartilhar.
Devemos sempre nos importar com causas assim, e alcançar vidas com as ferramentas que temos, sendo o blog um ótimo canal para isto.
Um forte abraço.
Camila Gomes
Achei tudo este texto.
E vamos por um fim a violência contra a mulher.
Outro abraço.
Todos (as) Contra a Violência contra a mulher :D
http://dezapaixao.blogspot.com.br/
Querida amiga Vanessa !
Perdoa-me a invasão de seu espaço, mas achei-o na NET por acaso e resolvi visitá-lo. Gostei do que vi. Seu texto é interessante. Parabéns. Já sou seu seguidor.
Beijos de luz !!!
POETA CIGANO - 27/11/2012
http://carlosrimolo.blogspot.com
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